O Refúgio Aberto faz jus ao nome que carrega

Escrito por: Jose Gabriel Fernandes

em 06 de maio de 2019

Na noite da última sexta-feira de abril (26), estive no RDC da PUC-Rio para acompanhar o chamado Refúgio Aberto – evento que reúne críticos de cinema e produtores de conteúdo audiovisual relativos ao assunto. Os convidados da vez eram os youtubers Max Valarezo (Entre Planos), Joyce Pais (Cinemascopetv), Tiago Belotti (Meus 2 Centavos), Luísa Pécora (Mulher no Cinema) e Gabriel Gaspar (Acabou de Acabar). Todos compunham uma mesa administrada por Lucas Maia, do canal Refúgio Cult.

Como era a minha primeira vez numa edição do evento, não sabia bem o que esperar. Como tudo seria organizado? Qual seria o tema? Como o público participaria disso? Admito que estava um pouco perdido. Porém, logo antes do debate começar, esquecemos essas formalidades graças ao contagiante entusiasmo das pessoas que estavam chegando. Enquanto se acomodavam no auditório, já estavam ansiosas para discutir cinema – algo que foi colocado em uso na sequência, graças a um rápido quiz promovido por Maia. Inconsequentemente, me peguei tentando lembrar de pequenas curiosidades, como a quantidade de filmes que Scorsese e De Niro fizeram juntos. Só nesse impulso, coloquei relaxados neurônios para trabalhar, me recordando de obras que já estavam enterradas em meu subconsciente, como Caminhos Perigosos (1973) e New York, New York (1977).

Começando o debate, com a apresentação dos participantes, ainda me perguntava qual seria o tema, quando fui surpreendido pela questão do Artigo 13 (o atual Artigo 17). Para quem não sabe o que é isso, diz respeito às novas regras para produção de conteúdo na internet na Europa. A proposta foi aprovada recentemente no Parlamento Europeu sob o pretexto de proteger os direitos autorais de artistas e jornais. Ela obrigaria “grandes prestadores de serviço que armazenam e facultam grande quantidade de material protegido”, como o YouTube e o Facebook, a filtrarem conteúdos que poderiam ter algum uso indevido da propriedade intelectual alheia. Muitos produtores de conteúdo online protestaram contra a medida, alegando que isso poderia não só afetar os seus trabalhos, mas também limitar a liberdade de expressão. O próprio YouTube se colocou contra a medida, alegando que nenhuma empresa teria como arcar com os custos que essas mudanças trariam (via G1 e MSN). Para ter acesso ao texto oficial, clique aqui.

Alguns integrantes expressaram preocupação quanto à realidade meio distópica que se aproximava, mas tudo foi conduzido de maneira bem leve, como uma conversa em mesa de bar. Esse, aliás, foi o tom das (aproximadamente) três horas de debate: diversos assuntos vastos, abordados com uma linguagem acessível e descontraída, sem perder a profundidade. Além de flexibilizar a comunicação, esse tom proporcionou momentos verdadeiramente divertidos, que arrancaram risos do auditório. Quando passaram para a próxima questão, a primeiro ainda não tinha se esgotado – o que não deve ser visto como algo negativo, pois só mostra o desejo e a necessidade de cobrir tantos assuntos que não temos tempo nem para vislumbrar durante a correria do dia-a-dia.

Muitas discussões passaram pela mesa: da possibilidade de um bom ator salvar um roteiro ruim à velha questão do “autor versus obra”. As colocações dos palestrantes não foram todas unânimes (e nem deveriam ser), mas não deixaram de ser brilhantes – cada uma da sua forma. O mesmo vale para as perguntas da plateia no final, que injetaram nova vida à discussão. De repente, já estávamos falando sobre cinema nacional e o futuro na área, mostrando também uma saudável inquietação por parte da juventude. Todos querem fazer acontecer, e procuraram nas figuras ali presentes sugestões para problemas palpáveis e atuais.

Sendo assim, o que mais tirei disso tudo foi a noção de que a cinefilia ainda está firme e forte na cena carioca, apesar dos tempos confusos em que vivemos. O Refúgio Aberto me fez lembrar de uma velha necessidade, muito reforçada pela geração da Nouvelle Vague, de não só assistir a filmes, mas também debatê-los. Ao contrário do que muitos podem pensar, os cinéfilos não precisam viver numa bolha. A troca de ideias é fundamental para o nosso meio, e a possibilidade que o evento oferece para fazê-lo de maneira construtiva e respeitosa o torna um verdadeiro refúgio para o fãs da sétima arte, especialmente recomendável para artistas e críticos iniciantes, que se encontram meio perdidos de vez em quando (como o que vos escreve).

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