Crítica | El Camino

Escrito por: Jose Gabriel Fernandes

em 13 de outubro de 2019

Os créditos iniciais surgem com uma identidade visual diferente do verde tóxico que nos acostumamos a ver na abertura de Breaking Bad. Uma paisagem ensolarada, porém, nos lembra vários momentos da série, passada em Albuquerque, Novo México. A silhueta de uma cabeça se assemelha à de um dos personagens principais, quando, em pouco tempo, uma voz familiar entrega o nome por trás do misterioso busto: Jesse. Corta para um plano que revela a face dele e do dono da voz, Mike (Jonathan Banks), enquanto estão tendo uma conversa casual e olhando para o horizonte. O assunto é a saída da vida que estavam levando. Um afastamento das operações do famoso Heisenberg – algo que quem viu a série sabe que não aconteceu da maneira que estavam planejando.

Passando para o “presente”, continua-se exatamente de onde a jornada de Jesse Pinkaman tinha parado: ele fugindo de carro, emocionado, para um destino que pouco interessava. O final aberto, de repente, vira um recomeço, com Pinkman avistando policiais à caminho do local onde estava. Deixa de ser prisioneiro, se torna fugitivo – e é isso que vemos durante as duas horas de El Camino: as complicações que ele enfrenta para ficar, de fato, livre. Paralelamente a isso, flashbacks mostram o seu tempo em cativeiro, entre outras coisas. Em suma, um aprofundamento na personalidade e nos traumas deste personagem tão querido pelos fãs.

Apesar de uma ambiência, por muitas vezes, menos vibrante ou jocosa do que a da série – sendo uma produção um pouco mais sóbria e austera -, o diretor Vince Gilligan (criador de Breaking Bad) soube contar uma história completamente pautada naquele universo, com direito a participações de diversos integrantes do elenco. Isso permite a introdução de momentos que servem como verdadeiros fan-services para quem acompanhou o programa, se valorando um pouco pela nostalgia. Mas, diferentemente de outros revivalsEl Camino não fica só nisso, pois Gilligan é responsável ao ponto de encaminhar uma trama suficientemente atrativa por si só.

Sua notável capacidade de conduzir um suspense de maneira elegante e concisa também se faz presente aqui, através de uma decupagem pragmática, uma edição bem compassada e um roteiro que desenvolve situações de forma surpreendente ou recompensadora. No início, o texto se conforta um pouco demais no que já construiu na série (e às vezes cambaleia de volta para isso), mas, quando mostra a que veio, revela opções tão inusitadas e criativas quanto as da produção original – apesar de dificilmente alcançar o mesmo nível de tensão ou imprevisibilidade.

Em termos de atuação, é um filme inteiramente dedicado ao talento de Aaron Paul, permitindo que ele brilhe mais uma vez como Jesse. Como sempre, o ator passa muita intensidade no papel, mas, desta vez, isso é ainda mais acentuado, já que deve transmitir os traumas do personagem com poucas palavras. É o conto de um homem que, após literalmente se libertar de uma prisão, tem de se preocupar em não voltar a uma, além de consumar sua libertação em mente. Esse foco permite que algumas de suas características essenciais, como o apreço que tem pela vida alheia, sejam postas em uso.

Apesar de seu protagonismo, Jesse cruza com outras figuras da série, como foi mencionado anteriormente. Para evitar spoilers, melhor não citar todos, mas é válido ressaltar a participação do recém-finado Robert Forster, que não só é um destaque entre os coadjuvantes (até por aparentemente ter mais tempo de tela que os mesmos), como também divide uma das melhores cenas do filme com Paul, com um desfecho bastante engraçado. Sua serenidade e rigidez são perfeitamente capturadas pelo ator. Outro que rouba a cena é Jesse Plemons, numa versão mais aprofundada e… perturbadora de Todd.

Para os fãs de Breaking Bad, que viram tudo até o fim, El Camino pode ser um pouco redundante: um detalhamento desnecessário de um final que já estava perfeito. Porém, não é algo que afeta negativamente o legado da obra, além de ser uma peça de entretenimento sensível e particularmente prazerosa para quem estava sentindo falta daquele universo. No mínimo, um produto televisivo tão cinematográfico quanto o que o precedeu, sendo, então, altamente recomendável.

Crítica | El Camino
El Camino está mais para um epílogo do que um novo capítulo, não afetando muito o conjunto da obra e, ao mesmo tempo, representando um retorno ao universo de Breaking Bad. É um pouco redundante, mas não deixa de ser um agradável presente para os fãs, além de se sustentar sozinho como um bom thriller de fuga.
3.5

Compartilhe!